30 de janeiro de 2017

Juros em queda e o fim da renda fixa no Brasil



            Em Julho de 2015 a taxa de juros básica da economia brasileira, a SELIC, atingiu incríveis 14,25%, maior valor desde 2006. Patamar este que foi mantido durante boa parte do ano de 2016 alimentado pelo agravamento da crise econômica e política. Com o rally do impeachment concluído com sucesso os ânimos do mercado se acalmaram e foi possível observar grande recuperação do mercado de ativos no país, tal qual a recuperação do IBOVESPA e do IFIX.
            Contudo, a pressão inflacionária que se viu iniciar em 2014 começou a dar sinais de cansaço ao final de 2016 e no último trimestre deste ano iniciou-se um ciclo de cortes da taxa SELIC. Iniciado de maneira modesta pelo Banco Central com cortes na ordem de 0,25% anuais a primeira reunião do COPOM em 2017 trouxe uma surpresa, um corte de 0,75%, o suficiente para se espalhar a ideia que as opções de investimento em renda fixa estavam acabadas nas terras tupiniquins. Portais de corretoras de grande atuação no mercado passaram a difundir o pensamento que a partir de agora as apostas mais decentes do mercado seriam em renda variável, que o Brasil estaria pronto para viver logo uma era com uma taxa básica de juros real na casa de 0%. Pronto! A renda fixa acabou pelo jeito, vou me livrar de minhas aplicações em Tesouro Direto, CDB, LCI, LCA, fundos DI.
            Antes de começar esse processo de mutilação que é o giro patrimonial vamos parar por um momento e analisar alguns números dos últimos três anos: o IPCA, a SELIC e os juros reais praticados no Brasil neste período. Primeiramente, o que são juros reais? Juros reais são nada mais, nada menos, que a taxa básica de juros (SELIC) descontados da inflação medida (IPCA) no período analisado, ou seja é a verdadeira taxa de aumento do patrimônio e o valor que importa na escolha dos investimentos. Há quem acredite que basta subtrair a segunda da primeira, isto funciona razoavelmente bem em países nos quais a inflação tende a zero, mas estamos no Brasil então há um pequeno truque:

Fórmula para o cálculo de juros reais

            Diante desta informação pode-se comparar os juros reais no Brasil nos últimos anos, conforme mostrado no gráfico a seguir para 2014, 2015 e 2016:

SELIC, IPCA e Juros Reais no Brasil nos anos de 2014, 2015 e 2016.

            É possível notar que juros reais variaram essencialmente em torno dos 4,50% anuais em todo o período de análise, inclusive durante boa parte de 2016, por muitos chamado de ano da renda fixa no Brasil. A exceção encontra-se no final de 2015 e início de 2016 onde houve um pico inflacionário e para os últimos meses de 2016 quando se teve uma trégua no IPCA, levando aos maiores juros reais do período em análise. Diante desta constatação entende-se porque os juros estão em queda, o ano de 2016 encerrou com os maiores juros reais nos últimos anos!
            Ok, isso foi em 2016 e taxas vistas no passado não são garantias de rendimentos futuros, o que pode-se esperar para 2017? Para nos auxiliar nesta análise recorre-se a ajuda do boletim Focus liberado pelo Banco Central em 27/01/2017 que reúne as expectativas do mercado para 2017 com SELIC de 9,50% e IPCA de 4,70% e em 2018 com 9,00% e 4,50%, respectivamente.

Previsões do Boletim Focus para 2017 e 2018

            Observa-se novamente que os juros reais praticados devem situar-se próximos à faixa de 4,50%. O que justifica este pânico no mercado a respeito da renda fixa? Quem sabe o longo prazo então? Bom, não sou especialista em Economia, porém o Brasil tem uma dívida bastante elevada e em vez de buscar reduzi-la, na verdade trabalha com um rombo declarado para os próximos exercícios, ou seja, precisará fazer novas e maiores dívidas para quitar dívidas anteriores, como pensar em juro real próximo a zero? Se o Banco Central resolver passar por cima deste princípio e reduzir à força os juros no Brasil (não esqueçam que em 2018 teremos eleições) quem ajudará o país a rolar a dívida tendo o risco elevado e o prêmio reduzido? Sinceramente é muito difícil acreditar em uma queda vertiginosa nos juros reais por aqui nos próximos anos ou quem sabe décadas, visto que o governo terá que arcar com títulos do tesouro a taxas elevadas até 2035 ou 2050.
            Se a SELIC ou o CDI lhe parecem muito pouco num cenário de inflação mais comedida, fique à vontade para buscar outras opções de investimento mais rentáveis, mas dificilmente o Brasil perderá a fama de país da renda fixa nos próximos anos.

18 de janeiro de 2017

TRÊS ORÇAMENTOS SÃO REALMENTE SUFICIENTES PARA PESQUISA DE PREÇOS?



Qualquer pessoa que tenha o mínimo apreço ao seu suado dinheiro sabe que pesquisar é uma das saídas para que o salário chegue até o fim do mês e, com um bocado de sorte, até mesmo sobrar para algum gasto futuro ou para aquele agradinho a alguém especial ou para você mesmo. Nos momentos de dificuldades como este que passamos percebe-se ainda mais a evidência do tema na mídia: inúmeras são as reportagens sobre compras coletivas no atacado; diferenças expressivas sobre o material escolar das crianças (em alguns casos superando os 100% para um mesmo item); sobre os chocolates na Páscoa; os produtos das ceias de fim de ano e por aí vai...
            Na Construção Civil este assunto não seria diferente, afinal são centenas, até mesmo milhares de insumos que fazem parte de uma obra: desde pregos e arames; passando por cimento, areia e brita; até os acabamentos como tintas, cerâmicas, louças, metais e produtos de limpeza para a finalização da obra. Contudo, disseminou-se uma cultura que apenas três orçamentos são suficientes para encontrar um preço adequado, será mesmo? Qual pode ser a origem desta ideia?
            Há inúmeros estudos sobre a maneira de agir dos humanos que mostram que o processo de escolha de qualquer coisa é facilitado quando se apresenta uma terceira opção, seja no tamanho da pipoca do cinema ou na bebida (pequena, média ou grande) enfim, não é o objetivo deste blog ir a fundo no funcionamento do cérebro humano e tenho sérias dúvidas que seria este o motivo deste número, o três, ter se fixado na mente da população. Este critério de comparação pode ter sido adotado intencionalmente (ou não) pelos nossos legisladores à época da redação da Lei de Licitações e Contratos na Administração Pública, a famigerada Lei Nº 8.666 de 21 de Junho de 1.993 que solicita um número mínimo de três propostas para dar andamento aos processos licitatórios afim de se ter um valor de referência dos preços praticados no mercado, talvez este comportamento popular tenha esta origem.


Qual sua pipoca: pequena, média ou grande? Neste caso a porção média tem como objetivo impulsionar as vendas da porção grande.

            Atualmente é muito fácil fazer pesquisas de preço, pode-se utilizar os canais de venda disponíveis na internet, solicitar cotações por e-mail, telefone, e de vários fornecedores ao mesmo tempo. Quem diria, há sites especializados em comparação de preços hoje em dia! Será que apenas três orçamentos são suficientes para retratar os preços praticados pelo mercado? Quantas cotações devo obter? Dez, vinte, seria um número adequado?
            Para responder estas perguntas é preciso relembrar o que foi citado logo acima: na Construção Civil podem ser utilizados centenas ou até mesmo milhares de insumos a depender do porte do empreendimento, logo, despender tanto tempo assim pode não ser interessante ou até mesmo inviável. Para auxiliar neste dilema pode-se apelar a um método estatístico, neste caso em particular vou tratar do método exposto no livro "Como Preparar Orçamentos de Obras, de Aldo Dórea Mattos, da Editora PINI:

Fórmula exposta no livro "Como Preparar Orçamentos de Obra, de Aldo Dórea Matos, Ed. PINI

Onde tem-se que:

NC = Número mínimo de cotações;
s² = Variância da amostra;
xi = Valor de uma cotação;
x = Média das cotações;
N = Número de cotações colhidas.

            Vamos seguir com um exemplo, neste caso uma breve pesquisa online sobre latas de tinta acrílica na cor branca, embalagem de 18 litros, todos do mesmo fabricante:


            Estão tabulados valores de oito diferentes fornecedores e seus respectivos preços para exatamente o mesmo produto, a média é calculada para a amostra tal qual a variância da mesma (programas de planilhas eletrônicas contam com fórmulas prontas para estes dois itens da expressão), quando as variáveis são colocadas na expressão do número de cotações obtem-se 4,33, ou seja, um número mínimo de 5 cotações já traria representatividade à amostra. Neste caso a pesquisa se mostra suficiente. Caso o NC seja muito alto provavelmente algum preço pesquisado se encontra relativamente acima dos demais, então é válido retirá-lo da amostra para se evitar distorções e então repetir o processo.
            Caso a situação seja de elaborar um orçamento é recomendável adotar o valor médio da amostra e não o valor mais barato encontrado. Isso se explica na possibilidade de haver um hiato de tempo entre a cotação e a aquisição do produto, não sendo possível sua obtenção pelo mesmo preço quando na execução, evitando estouro de orçamento. Geralmente nesta situação o orçamento já foi aprovado, então qualquer ganho obtido em condição especial, negociação ou venda em quantidade fica com o emissor do orçamento, assim como no caso contrário, com as perdas.
            Se a pesquisa é simplesmente para aquisição, não há problemas em se escolher o fornecedor que ofereça a melhor condição de negócio, seja o menor preço, procedimento de entrega, prazo ou confiabilidade.

10 de janeiro de 2017

Quero construir ou reformar, como contratar a mão de obra?



            Em diversos momentos da vida nos vemos em situações que algumas mudanças no lugar onde vivemos seriam bem-vindas. Pode ser que a família esteja aumentando, talvez mais espaço para fazer aquele churrasco nos finais de semana, montar uma bela sala de televisão com home theater, reformar a cozinha para agradar a(o) parceira(o) ou sua sogra está vindo morar com você, que bela surpresa! Quem sabe você tem um lote vago e está pensando em construir para vender, talvez alugar?
            Você faz um planejamento inicial e decide iniciar a obra, entra em contato com seu empreiteiro e ele te pergunta: como você quer fazer? Você pode não perceber, mas muitos problemas que provavelmente te perseguirão ou assombrarão durante a obra tem grandes possibilidades de se inicia justamente após esta pergunta caso você não tenha um conhecimento básico sobre os modelos de empreitada mais comuns do mercado da construção civil.
            Neste artigo serão abordadas as variações mais comuns de contrato de prestação de serviços em obras, o que diferencia cada uma delas e alguns dos cuidados que podem ou devem ser tomados.

 ·         Empreitada Global (Construção a preço fechado):

            Contrato preferido pela Lei N.º 8.666 de 1993, que institui normas para licitações e contratos de administração pública no Brasil. Os valores são acordados previamente entre as partes para a execução do serviço como um todo, incluindo material, mão de obra e equipamentos, sem possibilidade de aumento ou redução nos preços, ou seja, se o contratado gastar mais do que estimou arca com perdas ou prejuízos e caso gaste menos fica com o lucro excedente. Todavia, os preços podem ser reajustados em contratos nos quais os efeitos da inflação não são desprezíveis, geralmente com base em índices específicos da construção como o INCC ou o CUB.  Existe a possibilidade de efetuar os pagamentos em etapas pré-definidas ou conforme o progresso dos serviços.
            A Empreitada Global é um meio de proteger o contratante, visto que a maior parte dos riscos são assumidos pelo empreiteiro. Contudo alguns cuidados devem ser tomados como a discriminação precisa dos serviços a serem executados através projetos a nível executivo (detalhes conforme irão para a obra) e/ou memoriais descritivos. Caso as informações fornecidas pelo contratante sejam insuficientes, deixem margem para dúvidas, os projetos sejam alterados ou imprevistos relevantes aconteçam a parte contratada pode solicitar os famigerados aditivos, podendo inviabilizar a obra ou estourar o orçamento e prazo, sem contar o desgaste causado. Situações de aditivos merecem atenção, geralmente não é feita nova consulta de preço com concorrentes, pois é pouco interessante colocar outro empreiteiro na obra e também o contratado ao perceber que pode estar tendo perdas ou até mesmo prejuízo na obra resolve recuperar sua mais-valia através das adições.

 ·         Empreitada por Preços Unitários:

 

            Diferentemente da Empreitada Global, nesta variação os preços são previamente acordados entre as partes não para a obra como um todo, mas para cada tipo de serviço como: movimentação de terras, execução de estruturas, alvenarias, pontos de elétrica, acabamentos e outros. Esta modalidade de contrato é desejável quando os projetos não estão plenamente desenvolvidos, há perspectivas de alteração ou em contratos de manutenção.
            O valor final do contrato não é fixo, podendo sofrer alterações para mais ou para menos, a depender do acréscimo ou redução de serviços e, assim como na empreitada global, os valores unitários podem estar sujeitos a correção por índices inflacionários. Os pagamentos exigem a medição de cada atividade executada individualmente, o que, dependendo da escolaridade da mão de obra contratada, pode ser um problema uma vez que o contratado pode pensar que está sendo enganado e que está ganhando pouco e se trabalhar pouco ou devagar realmente vai ganhar pouco, talvez não o suficiente para pagar suas próprias despesas ou funcionários.
            A empreitada através de preços unitários é uma modalidade neutra em termos de proteção ao contratante, visto que não se pode garantir no momento da assinatura do contrato de prestação de serviços qual será o valor da obra e seu respectivo prazo, dificultando a imposição de metas contratuais. Contudo, a clareza nos valores pagos por cada serviço facilita bastante no caso de uma rescisão unilateral de contrato, desde que o acompanhamento, medição e registro das atividades já concluídas esteja em dia e devidamente assinado por ambas as partes.
  
·         Administração de obra:

 

            Nesta modalidade contratual a remuneração do empreiteiro se dá através de um percentual ou comissão sobre os custos de obra (podem ou não ser de responsabilidade da contratada), a incluir material, mão de obra e equipamentos ou então uma remuneração fixa periódica. Como o empreiteiro é comissionado não faz sentido falar em correção por índices inflacionários, visto que a remuneração do mesmo se dá sobre valores que vão sendo corrigidos com o tempo como os valores pagos em insumos, aluguel e aquisição de equipamentos, além de valores de hora base sobre salários de funcionários da obra.
            Este tipo de contrato é muito perigoso para o contratante uma vez que o empreiteiro ganha (em valores absolutos) tanto quanto mais cara a obra se torna, o que pode ser agravado mediante práticas nocivas de fornecedores que oferecem a imoral Taxa de Engenharia, na qual o empreiteiro acaba embolsando parte do valor das aquisições para garantir que determinados fornecedores sejam beneficiados com a parceria. Também é válido ressaltar que o contratado não é beneficiado por qualquer economia gerada durante a construção, o que pode elevar o desperdício de insumos e à baixa produtividade da mão de obra.
  
·         Sistema misto:

 

            Foram apresentados alguns dos mais comuns tipos de contrato observados na Construção Civil. Contudo, cada contrato é uma peça individual e pode conter cláusulas características de uma ou mais modalidades apresentadas acima ou itens adicionais como condições de desempenho, determinação de preços limites, questões relativas a aditivos, multas, bonificações, entre outros. Estes são casos mais complexos, mas que com a devida assessoria podem evitar problemas e minimizar prejuízos futuros.
  

Qual o melhor tipo de contrato, afinal?

 

            Esta pergunta não tem uma resposta direta, cabe a você analisar a situação da obra que pretende realizar, do nível de confiança no seu empreiteiro e do seu nível de conhecimento sobre a área de construção em si para pesar o que cada modalidade oferece de melhor no seu caso. Se não tiver certeza sobre como agir procure ajuda profissional de um Engenheiro, Arquiteto ou até mesmo Advogado, investir um pouco em prevenção no final das contas acaba se revertendo em economia ao se evitar transtornos futuros.